Artigos de Opinião
eSports: Um espelho da realidade de gestão de talentos Portuguesa?
Há 8 anos que estou ligado aos eSports, como jogador e manager, estando neste momento a liderar uma equipa com mais de 80 atletas.
O digital e o trabalho remoto ganharam dimensão durante a pandemia e tornaram possível o evitar de filas de trânsito e o isolamento social. Não é neste período que os eSports nascem, mas é neste momento a grande expansão naquilo que foi o consumo dos conteúdos e até mesmo o nascimento de novas estrelas – os retalhistas de consolas que o digam. Vendeu-se como nunca: consolas, jogos, comandos, volantes, óculos VR… uma panóplia que quem cresceu nos 90s queria ter, mas que as condições financeiras não permitiam (o velho paradoxo tempo vs. dinheiro à medida que crescemos).
Comecei a minha aventura como manager de eSports praticamente do zero, mas a missão era simples: encontrar talentos escondidos, com zero encargos financeiros – é impossível competir sozinho contra as grandes organizações do sector. Começámos a crescer, a ter resultados, tentando adiar o inadiável: vermos sair quem realmente era bom. Sim, tentamos dar condições, temos uma boa equipa, um espírito de entreajuda, mas do que vale isso se não conseguimos competir com um salário profissional? O “zero” financeiro tem um enorme peso na balança na hora de decidir – as equipas profissionais sabem disso.
Olho para “dentro” e sei que as minhas dores são as das grandes equipas nacionais, que sofrem com os internacionais. O caso mais gritante será o de Diogo Pombo (também conhecido por Tuga810), galardoado na Globe Soccer Awards como melhor jogador de futebol virtual do Mundo. Para tal, foi necessário sair de Portugal e encontrar, em Espanha, através de uma parceria entre a Movistar e McDonald’s (à qual se juntou agora o Atlético de Madrid), que apostaram nesta nova realidade, encontrando nos eSports uma porta para as gerações mais jovens. Em Portugal, Diogo é respeitado e admirado, no entanto, não teve nunca as condições que agora tem: treinador, salário, custos de representação, entre outras.
Esta realidade é replicada em todos os sectores da sociedade e hoje, como Business manager de uma empresa de Inovação e Tecnologia, sinto que o que fazia de forma extracurricular me deu ferramentas para que, profissionalmente, hoje pudesse dar resposta.
A realidade é que Portugal é um dos maiores criadores de talento por metro quadrado. Seja no futebol, seja na saúde, na economia, no IT, entre tantas outras realidades.
O IT em Portugal acaba por ser financeiramente competitivo para os grandes players europeus e americanos, tendo encontrado em Portugal o local ideal para criar startups, hubs tecnológicos e fazer prospecção de talento.
Sim, o talento paga-se, o que torna impossível uma empresa portuguesa, com uma ideia inovadora competir com uma grande empresa europeia que precise de alguém com o perfil certo. Estamos a filtrar. Estamos a criar uma espiral em que, quando podemos e devemos criar oportunidades, inovar e crescer, sentimos que o nosso tecto é mais baixo do que lá fora: por isso saímos. Este é o preço a pagar pelo falta de capacidade financeira tanto nos eSports como no IT.
Mas é aí que somos bons: transformar pouco em muito, nada em tudo.
A Inteligência Artificial, por muito desenvolvida que seja, demorará, se algum dia vier a ter, capacidade de se reinventar, de encontrar e formar talento. Daí cada vez mais ser importante, mais do que capacidade financeira, termos bons parceiros, boa capacidade de recrutamento e uma equipa de Recursos Humanos próxima do colaborador e verdadeiramente humana.
Então, como podemos reter nossos melhores talentos? O que devemos fazer para que a nossa equipa e elementos-chave escolham ficar connosco?
Penso que, mais do que nunca, a estratégia passa por ter bons líderes no topo da pirâmide. E acreditem, não é tão difícil tê-los. E perguntam «como assim não é difícil?». Porque bons líderes, para o serem, para além da capacidade de comunicação, gestão de tempo e tomada de decisão, acredito que devem primeiro ser alguém que transmita confiança e com valores na vida, liderando não só na vertente profissional, mas acima de tudo manter uma ligação directa com a sua equipa!
Quando decidimos por outro projecto, estamos, em certa medida, a escolher outro líder. Sim, o company culture é importante, mas a chave para o sucesso e retenção, passa por conseguir criar ligações pessoais com os colaboradores.
Estará o C-Level em Portugal capaz de se superar neste desafio?
Artigo disponível no site da Human Resources Portugal